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terça-feira, 23 de novembro de 2010

Até as últimas conseqüências

Mateus 5, 10-12

“Felizes os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Felizes são vocês quando, por minha causa, lhes injuriarem e lhes perseguirem e, mentido disserem todo tipo de maldade contra vocês. Fiquem imensamente alegres, porque a sua recompensa nos céus é grande, pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vocês”.

Tentamos visualizar o texto das bem-aventuranças como os caminhos de descida daqueles que subiram o monte. Subir o monte é se achegar ao lugar simbólico do Pai, encher-se dos céus. Mas é preciso descer o monte, e se encher também do chão. Se pensarmos os três últimos textos como uma mesma e única bem-aventurança, chegamos aqui ao cume do paradoxo.

Os caminhos da felicidade propostos por Jesus são estranhos para a sua época, mas continuam estranhos para a nossa época, mesmo depois de dois mil anos de impregnação da doutrina cristã.

Chegamos a pensar que a pregação de Jesus não tem muito a ver com a pregação da Igreja. O chamado aqui é a um seguimento tão radical que a última e inevitável conseqüência seria a perseguição.

Ser ofendido, maltratado e caluniado, ou seja, ser perseguido, não é casual ou conjuntural, mas é critério de verificação de como estou caminhando.

Alegrar-se na perseguição, é desafio de encontrar o máximo de exultação, no paradoxo, do máximo preço a ser pago por um seguimento radical, ou seja, que examina as raízes da violência e luta para cortá-las.

A Igreja comumente separou a perseguição por causa da justiça e a perseguição por causa de Jesus. Mas a causa de Jesus era a causa da justiça tomada em sua máxima expressão.

Jesus era um místico, ou seja, para ele Deus não era um conceito distante ou uma discussão filosófica. Deus era o Pai, Abba, que vivia intensamente em sua interioridade, de tal modo que a experiência do Pai e a experiência de si mesmo era praticamente a mesma coisa.

Mas a tarefa de Jesus era a luta por um ser humano mais justo em um mundo mais justo. Um mundo governado pelos valores do Pai.

Transformar Jesus em uma mera figura litúrgica, espécie de religioso interessado apenas em rituais, foi um modo de domesticar a sua lembrança, diminuindo a força de sua mensagem.

O convite de Jesus para segui-lo nos caminhos de descida da montanha sagrada, não apresenta nenhuma dose de ilusão. O resultado será a perseguição dos poderosos e a calúnia dos que vivem de bem nas estruturas vigentes.

Assim aconteceu com todos os profetas. Quem está com o Pai e com os profetas, decidiu por um dos lados da sociedade. Procura estabelecer a mudança radical dos alicerces sociais. Por isso, a perseguição.

Paradoxalmente, por isso também, o motivo da máxima alegria.

Os oito caminhos de descida da montanha sagrada se consumam na perseguição. Eles se entrelaçam, se combinam e se complementam. Na verdade é um único caminho, o caminho estreito. Mas este é o estranho caminho para a felicidade.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O caminho da construção da paz

Mateus 5,9

“Felizes os pacificadores porque serão chamados filhos de Deus”.


Este modo de caminhar de volta da montanha sagrada é um caminho prático, desse que fazer com a vida, exatamente essa vida de um coração puro, ou seja, cheio da visão do Reino.

O caminhante é economicamente solidário (pobre de espírito), é sensível (chora), sabe onde aplicar a sua força (manso), alimenta-se da justiça (fome e sede de justiça), aprende a parir (misericordioso), e é intenso em seus propósitos (puro de coração). Mas, o que faz com tudo isso?

O caminhante é um construtor de mundos impossíveis, é um artesão da paz.

A paz não é parte natural das estruturas vigentes, precisa sempre estar sendo construída. É o teor de mundos impossíveis, sempre mais adiante, utopias inacabadas porque inacabáveis.

A abundância e a justiça produzem a paz. Por conseguinte, o pacificador não é sujeito passivo diante da violência estruturada. Em um mundo desigual, a experiência da paz passa pelo conflito; e o artesão da paz coloca-se no conflito do lado de quem sofre opressão e injustiça.

Ainda mais, na construção das condições da paz, o artesão sempre provoca conflito.

A organização da violência vai desde as instituições ao interior das pessoas. Combater a violência e construir a paz, começa na nossa interioridade, mas se atualiza em todas as relações e alcança micro e macro-estruturas. Violência sexual, racial, econômica, política e religiosa.

Construir uma rede de paz que combata a rede de violência é tarefa monumental, caminho a percorrer por toda a vida. Re-significar, re-simbolizar e re-organizar, são estratégias de combate, nessa guerra sem fim pelo fim de todas as guerras.

O artesão da paz será chamado filho de Deus. Deus, portanto, é o Deus da paz e da justiça: não o Deus da guerra e da opressão.

Ser filho de Deus é assumir compromissos com os seus compromissos: ter como tarefa a sua tarefa.

Caminhar como artesão da paz, descendo a montanha sagrada pelas veredas da história, é assumir um diferente caminho de divinização. O mesmo de Jesus: tornar-se divino, tornando-se plenamente humano.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

O caminho da intensidade do desejo

“Felizes os puros de coração porque verão a Deus”. Mateus 5,8

Um coração puro não é um coração vazio de vícios, mas cheio de uma coisa só. Ser puro é não ser misturado, é desejar uma única coisa, ter uma única paixão, o Reino de Deus.

O caminho dos apaixonados é o caminho dos tão ocupados com o amado que não sobra tempo nem espaço para nada mais.

Ser corpo apaixonado é ver, ouvir, sentir, tocar e falar apaixonadamente. E pensar com o coração que, segundo Pascal, tem razões que a própria razão desconhece.

O caminho da pureza não é o caminho da economia de afetos ou da contenção dos desejos, mas o caminho da plenitude nas relações concretas.

Ter um coração puro é desejar intensamente o amor; ansiar plenamente a verdade; buscar intensamente a justiça e acariciar amorosamente a misericórdia.

Essa intensidade de paixão torna-se paixão intensa por Deus e por pessoas concretas. Corpo apaixonado por corpos, amando e sendo amado, tocando e sendo tocado, acariciando e sendo acariciado.

A fonte da fidelidade ao amado e à amada está na intensidade do amor e não na vigilância ascética. O amor à amada se estabelece como amor ao amor, multiplicando mil estratégias e caminhos de carinho e cumplicidade.

A ética que vai caminhando pelo caminho do desejo, mantém um coração pulsante e um corpo preparado para a inteireza da ação.

Procurar uma pureza de coração é estabelecer harmonia e integridade entre ser e parecer, sentir e pensar, querer e agir.

Os puros de coração são felizes porque verão a Deus. Deus se torna visível não na restrição, na proibição, no sorriso comedido, mas na abundância, na afirmação, na gargalhada incontida.

Caminhar pela justiça, pela verdade e pelo amor, em sua pureza completa, significa diminuir os espaços para a injustiça, para a mentira e para a indiferença seca.

Deixar o coração pulsar cheio de sangue, nos ritmos de uma vida que se esparrama gratuitamente, sem economizar sons e cores.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Caminhando pelo útero de Deus

Mateus 5,7

“Felizes os misericordiosos porque alcançarão misericórdia”.

O caminho da misericórdia segue o da justiça porque ambos devem estar juntos. Misericórdia e justiça se completam.

A misericórdia define um modo de ser de Deus e a palavra é derivada da idéia de útero. Dizer que Deus é misericordioso é como se referir a um Deus com útero, acolhendo o disforme e lhe dando vida.

A justiça é fálica e o falo fertiliza o útero, mas somente quando ereto. A ereção acontece apenas em poucos momentos: a justiça é essa impossibilidade que somente pode ser desejada, já que sustentada por pouco tempo.

A sociedade androcêntrica e patriarcal está condenada à falência; somente através do útero da misericórdia o mundo melhor e mais justo pode ser construído. Masculino e feminino se unem no útero de um Deus que ultrapassa os limites da sexualidade humana.

Descer a montanha pelo caminho da misericórdia é caminhar pelas entranhas uterinas de um Pai que é Mãe.

Ser misericordioso como o Pai é aprender a usar o útero, para as mulheres, ou a ter um útero, para os homens, disponível para o acolhimento dos empobrecidos, dos fracos, das exploradas e dos oprimidos, o resíduo disforme das estruturas sociais.

Parir a justiça é o processo da misericórdia, útero que transforma em vida aquilo que antes era apenas esboço.

Um Deus misericordioso é um Deus cujo coração bate mais forte diante da fraqueza do outro. Proscritos, discriminadas, deserdadas, excluídos, todas as vítimas da sociedade, são acolhidas na interioridade desse Deus que tem lado: o lado do mais fraco.

Os que tratam os outros com misericórdia serão tratados com misericórdia. Serão acolhidos e acolhidas no útero de Deus e estarão sendo transformados e transformadas em seres cada vez mais humanos.

O segredo da nossa transformação em seres humanos está nesse outro e outra desumanizados. Quando tratamos o outro com misericórdia, somos tratados com misericórdia. A fraqueza e sofrimento do outro é o espelho em que visualizamos a nossa própria fraqueza.

Desse modo, acontece um mistério. Quando parimos o outro somos paridos também.

A misericórdia é o caminho através do qual engravidamos de nós mesmos, dando forma plena à nossa humanidade.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Procurando os caminhos da justiça

Mateus 5,6

“Felizes os que tem fome e sede de justiça porque serão fartos”.

Descer da montanha sagrada pelo caminho da fome e da sede é lembrar que fome e sede são estruturantes vitais.

Viver é ser faminto e sedento; somos seres definidos pela carência e pelo desejo. O sentimento de falta é estratégia da vida para continuidade e crescimento: a morte é ausência de necessidades.

Ser humano é ter fome e sede, ser feliz é dar qualidade às fomes e sedes de nossa vida. Ter fome e sede de justiça é admitir que justiça é ausência em vivências e estruturas marcadas pela injustiça.

A justiça é uma impossibilidade ontológica; a única possibilidade é o desejo, a carência entranhada, a busca voraz da justiça.

As palavras da montanha nos remetem a imagens de carências radicais: fome insaciável de pessoas subnutridas e sede de beduínos caminhantes de desertos.

Mas fome e sede são radicais em si mesmas. Não há solução para as mesmas, retornam a cada dia. Então, felizes são aqueles que se nutrem diariamente da luta pela justiça, que fazem da justiça a sua comida e bebida de todo dia; aquelas para quem a justiça é visceral.

No ambiente de Jesus de Nazaré, a palavra “justiça” nos remete a relações com Deus, consigo mesmo, com os outros, e à organização das relações sociais.

Portanto, ter fome e sede de justiça, é alimentar voraz e diariamente o desejo de Deus, o desejo por si mesmo, o desejo pelo outro e o desejo por uma sociedade mais justa.

Felizes os que tem fome e sede de Deus, fome e sede de crescimento pessoal, fome e sede de amar pessoas concretas, de carne e osso, fome e sede de um mundo melhor, com estruturas mais justas.

Quem assim alimenta diariamente a sua vida, quem assim dessedenta diariamente a sua paixão, experimentará a fartura e a saciedade.

Estranha promessa, paradoxo das vivências, mas experiência concreta, embora ambígua, de quem assume as lutas da vida.

Nesse mundo injusto, somos coletores e coletoras de justiça. Quando isso se torna hábito de cada dia, sementes de justiça que colhemos e gotas de justiça que encontramos, transbordam abundantemente sobre nossa fome e sede.

Até porque entendemos que os jardins da esperança e os rios do amor são formados de sementes e de gotas.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A luta pela posse da terra

Mateus 5,5

“Felizes os mansos porque herdarão a terra”.

Na disputa pelo direito de morar, os violentos parecem levar vantagem; mas Jesus garante para os mansos a herança da terra.

Os caminhos da vida, na descida da montanha sagrada, não passam pela violência, mas pela mansidão. Mas o que é ser manso?

A imagem que está por trás da palavra é a de uma fera sob controle. Somos animais ferozes e a nossa ira é constitutiva. Manso não é, portanto, aquele que nunca se ira, mas quem mantém a sua ferocidade sob rédeas, administrando a sua aplicação.

Passividade adoece; mansidão não pode ser fraqueza nem covardia, mas a sabedoria de aplicar a força do próprio corpo em objetivos justos.

Ser manso é se recusar a participar da estrutura de violência de uma sociedade de injustiça e exploração, que não defende o direito dos pequeninos; pelo contrário, usar toda a força do próprio corpo para derrotar essa sociedade e sua lógica.

Com a força do corpo, mansamente, Gândhi desmontou a violência da estrutura colonialista inglesa que subjugava a Índia, e Martin Luther King Jr, desmontou a violência da lei que oprimia os negros dos Estados Unidos.

“Não-violência”, comenta Gândhi, referindo-se ao Sermão do Monte, é a insistência pela verdade: estar disposto a resistir firmemente à violência opressora, até destruir a mentira de uma estrutura injusta.

Jesus se define como manso, mas aparece dirigindo a sua raiva, de chicote na mão, contra a transformação de sua “casa de oração” em “casa de ladrões”. Fustigando com o azougue os cambistas, fustiga o sistema de exploração econômica que tem o templo como centro.

O último momento de sua atitude de mansidão foi lançar o seu corpo contra a violência da cruz.

O milagre da ressurreição é a certeza de que a violência da morte pode ser destruída pela resistência insistente do corpo.

Com a força do próprio corpo e organizados como corpo, sem terras, sem tetos, sem direitos, sem armas, lutam para tornar a terra lugar de habitação da paz. Eles terão a posse da terra.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

As dores do mundo

Mateus 5, 4

“Felizes os que choram porque serão consolados”.


Os caminhos da vida apontados por Jesus são caminhos estranhos.

Ser feliz chorando parece uma dissonância. Manter o coração úmido e o olhar disposto às lágrimas não parece ser melhor do que aprender a se endurecer diante da dor e do sofrimento.

Mas, aprender a chorar, como caminhante que desce da montanha sagrada, é descobrir que a dor tem lado e se dispor a ficar do lado de quem chora e não de quem faz chorar.

Chorar a dor do outro é passo no caminho da solidariedade. Teimar em ser sensível é não se acomodar nem se alienar diante da dor da vida e da estrutura de dor montada pela sociedade desumana.

Chorar, então, passa a ser suspiro de humanidade, vigilância de corpo e consciência para que nunca se petrifiquem.

Entretanto, é preciso chorar também a nossa própria dor e a dor que causamos. Somos seres doloridos que fabricamos dores.

Deixar as águas da impotência e do arrependimento irromperem como lágrimas é sempre lavar os canais de comunicação para o mistério dos nossos sofrimentos mais profundos.

Porque não somos apenas prazer e alegria, mas também dores. E as dores que levamos e as dores que somos também precisam ser lavadas pelas lágrimas.

Os que choram serão consolados. Não é o choro que traz a felicidade, mas a consolação do Pai, à espreita apenas de quem tem a coragem de chorar.

Jesus chorou, diz o evangelho de João, diante da morte do amigo. Na nossa herança cristã, um Deus que é homem é um Deus que chora e entende a importância das lágrimas e da consolação.

Os caminhos para a totalidade e exuberância da vida passam pelas trilhas e abismos do sofrimento humano e humanizador.

Precisamos experimentar, no profundo mistério de um olhar que explode em lágrimas, pela força de um corpo que sangra até a morte, o mistério cotidiano de uma consolação e de uma ressurreição.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Uma atitude econômica radical

Mateus 5,3

“Felizes os pobres de espírito porque deles é o reino dos céus”.

O olhar de Jesus no monte traz o reino dos céus para a terra, apontando os caminhos da vida, a tessitura da felicidade.

A mística Santa Teresa d’Ávila dizia de si mesma que mais do que pobre era louca de espírito e não deixam de parecer insanas as veredas apontadas por esse carpinteiro, profeta e mestre, tão Filho de um Pai finalmente aproximado.

O primeiro caminho é de natureza econômica. Romper com a ideologia de Mamom parece ser a passada radical, início de caminhadas outras, de outras naturezas. Despossuir é aprendizado para ser, ou ir sendo, na busca de uma identidade que é desenho que nunca termina.

Uma tradução diz assim: “Felizes os que tem o coração de pobre”, porque não basta ser pobre é preciso aprender a se empobrecer, a trocar de verdade o possessivo “meu” pelo “nosso”. “Quando o pobre nada tem e ainda reparte, vai Deus mesmo em nosso mesmo caminhar” diz o verso da canção, cantiga de não ter, sendo.

O modelo é o próprio Jesus, que deixa a carpintaria, e vai viver a intensidade do reino dos céus, sustentado pelo Pai, como os pássaros dos céus e os lírios dos campos, despreocupado do dia de amanhã, aprendendo a ser Filho.

Uma disputa medieval precisava decidir se Jesus possuía ou apenas usava os poucos bens que levava, suas sandálias e roupas. Era urgente saber se monges e mosteiros podiam dispor livremente de terras e propriedades.

Mas o que é preciso é caminhar que caminho não é posse, apenas passagem e travessia. E nem sempre é o caminheiro quem caminha, mas o caminho quem lhe arrasta o caminhar.

Tão pobre de espírito que lhe resta apenas o corpo, e esse ameaçado pela fome, pela doença e pela opressão. Mas feito assim tão rico que o reino dos céus lhe pertence, enquanto governo, sabedoria, poder e visão de um Deus que ultrapassa todo e qualquer limite dessa injustiça estrutural.

Ser pobre de espírito não é se encontrar passivo diante da força do palácio, da teocracia do templo ou da ideologia do império, mas ser resistente.

Nessa sobra indestrutível, que se chama humanidade e que se chama liberdade, a qual a opressão não consegue dobrar nem o dinheiro comprar, poder e semente de construção de um novo mundo, o reino dos céus na terra.

Nesse novo mundo não há ricos nem pobres, mas irmãos e filhas do mesmo Pai, Pai da justiça, do amor e da felicidade.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Subindo a montanha sagrada


Mateus 5, 1-2

“Vendo Jesus as multidões subiu ao monte, e como se assentasse, aproximaram-se dele os seus discípulos; e ele passou a ensiná-los, dizendo:”

Os montes nos fascinam: desafiam os nossos limites e oferecem espaços de contemplação.

Em uma cadeia de sedução, os montes atraem Jesus, o carpinteiro aprendiz de profeta, que atrai seus estranhos seguidores, que atraem uma estranha multidão de proscritos.

Subindo o monte, Jesus se aproxima dos céus sem deixar de pisar o chão, e se assenta, como um rabino, desalojando simbolicamente os escribas e fariseus, os quais tentavam desalojar “a lei e os profetas” (como vai pronunciar algum dia).

Os montes ampliam a nossa visão e o profeta carpinteiro se torna mestre, trazendo lições do Pai e lições da vida.

As montanhas são sagradas, mas quando Jesus nos leva para o alto, soprando em nossa alma a Brisa de Deus, nos mostra os caminhos da volta, os caminhos para o chão da vida cotidiana, que podem ser caminhos de felicidade.

Mas sua receita de felicidade é estranha: felizes são os que têm coração de pobre, sabem chorar de dor, não são violentos, comem e bebem justiça, sabem parir, desejam intensamente a vida, constroem relações justas, mesmo quando sofrem toda a oposição dos injustos.

Abrindo a sua boca, Jesus partilha o mais íntimo de sua alma, segredos e vivências aprendidos no mistério da contemplação do Pai e da partilha de vida pelas pequenas aldeias da Galiléia.

Lugar que não era bem lugar, de povo que não era bem povo. Felicidade tem tempo e tem espaço, história e geografia, e passa pelo corpo.

A história e a geografia da felicidade é hora e lugar do oprimido e o corpo torturado do proscrito (homens, mulheres, crianças, pobres, pecadores, discriminados) é o barro da nova sociedade que surge como palavra de ordem e grito de guerra: “Reino de Deus”.

O governo de Deus não passa nem pelo templo, nem pelo palácio, e não requisita o corpo atlético dos opressores.

O governo de Deus desce do monte para a vida, pelos caminhos percorridos pelos corpos explorados e torturados das vítimas da religião e vítimas do Império.