quinta-feira, 12 de outubro de 2017

UM CRISTO À BEIRA DE UM INFARTO

diariodorio.com
Marcos Monteiro

Na noite do dia 02 sofri um infarto e fui submetido a cateterismo e angioplastia. Mudei de indicador estatístico e agora faço parte dos trezentos mil brasileiros que anualmente experimentam esse violento ataque cardíaco; setenta mil morrem e eu sobrevivi. As recomendações de repouso e de evitar esforço e estresse, a gente vai aprendendo pouco a pouco, porque estresse é essa reação indefinida do corpo a pressões cotidianas que caem sobre nós em camadas. O mundo desaba sobre o nosso coração, mas de modo mais ou menos sutil, como uma espécie de mal estar sem causa nenhuma.

Estamos em um momento adoecedor, desses em que parece, burlando o otimismo romântico e adocicado de Paulo Coelho, que todo o universo conspira para a realização de nossos piores pesadelos. Eduardo Galeano é quem nos lembra novamente, na edição de 2010 de seu clássico “As veias abertas da América Latina”,  da editora Paz e Terra, de que “Os sonhos do mercado mundial são os pesadelos dos países que se submetem aos seus caprichos” (p. 7).  Tempos em que a teoria do caos caminha em mão única e um arroto de Trump na Casa Branca é capaz de devastar o coração da floresta amazônica.

E é exatamente o coração do “gigante adormecido” que me preocupa. Desde a colonização, ele vem resistindo a golpes sucessivos e violentos; o sistema cardiovascular que constitui a sociedade brasileira tem sido sangrado em sua saúde mineral e em seu equilíbrio homeostático, de modo que esse caldeamento de sangues com que foi formada tem sido muito mais danoso para alguns, e o coração do índio e do negro resistiram e resistem ainda a inumeráveis ataques, um grito de esperança contra todo tipo de pressão e opressão.

Desse modo, constatar que o “homem cordial” é cada vez mais um cardiopata é bem natural. As estatísticas nos revelam o que já desconfiávamos: o infarto tem cor, idade, sexo, classe e território. Acomete muito mais a mulheres pretas, pobres, idosas e de periferia. Sou idoso, mas branco, classe média, e moro em uma boa casa de um bairro popular, mas também estou incluído, agora.

Esse texto no meu blog tem o objetivo principal de informar a amigas e amigos que ainda não souberam que estou em convalescença cardíaca e que o carinho e a amizade de tantas e tantos têm sido os meus maiores medicamentos. Claro que junto aqui o hábito adquirido de textualizar a vida e de pensar o cotidiano. Cada idoso com a sua mania. Mas realmente me preocupa a saúde do povo brasileiro, das suas instituições e dos seus símbolos. Assim, quero dirigir o meu cuidado maior para o Cristo Redentor.

Ao abrir os braços para abençoar o Brasil, de cima do morro do Corcovado, o Cristo deixou o seu coração exposto e ele tem sido alvejado cotidianamente. Especialmente, por aqueles que vociferam preconceito e ódio em seu nome. Uma denominada “bancada evangélica” tem fomentado e reverberado uma violência sagrada que atinge os mais vulneráveis da sociedade, exatamente aquelas que representam o Cristo e que são acolhidos de um modo especial no seu coração. Uma nova “Irmandade do Coração de Jesus” tem de ser levantada urgente para evitar o infarto do Cristo Redentor.

3 comentários:

  1. Meu querido Marcos monteiro ,fico feliz em saber que esta bem apesar do susto e de ainda esta se recuperando.talvez não se lembre de mim ,sou natalice do psol de Feira de santana ,suas palavras refletiram muito do que tenho sentido e venho falando com as pessoas por onde tenho andado ,infelizmente o mundo ta doente ,a maldade humana esta prevalecendo ,mas ainda bem que ainda existem pessoas como vc nesse mundo,grande abraço.

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    1. Lembro sim de vc, Natalice. Um grande abraço, muito obrigado e parabéns pelas lutas...

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  2. Marcos, feliz por vc e, junto com vc, lamentando a doença no coração da sociedade brasileira, em especial naquela parcela que deveria representar o coração amoroso do Cristo de braços abertos para a humanidade.

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