Não esperávamos a notícia da morte de Elisabete, o que nos
comoveu muito. Acostumados a vê-la enfrentar o câncer, em situações algumas
vezes tão drásticas quanto, esperávamos simplesmente a sua volta de mais um
internamento. Foram dez anos de uma luta que nos marcou, mas na noite de 19 de
outubro deste ano de 2017 recebemos a notícia. Doeu muito.
A presença de Bete nos cultos da Igreja Batista do Pinheiro
trazia um toque litúrgico especial. Estava sempre ali, quando o corpo deixava,
com um sorriso meio enigmático, como quem sabe segredos que gostaríamos de
perguntar. Na alma e no corpo levava essas misturas importantes para a nossa
humanidade de cada dia, feminista, cristã, atenta a grandes e pequenas
questões, intensa capacidade de crer, de lutar, de amar e de sofrer.
No Boquim da minha infância, no estado de Sergipe, havia um
busto na praça, homenagem ao poeta da cidade, Hermes Fontes, com os seguintes
dizeres, os quais parecem de encomenda para essa ocasião:
“Somente os que têm amado e têm
sofrido
E quanto mais sofrido mais amado
Podem mostrar no coração ferido
O seu altar o seu apostolado.”
Amar cada vez mais a cada maior sofrimento parece ter sido
missão e apostolado para Elisabete. O sofrimento é parte da vida e carrega a
ambiguidade de ser lugar de destruição ou de aprendizado. O pastor Martin
Luther King Jr, nos anos sessenta, conclamava os negros americanos a
transformarem a sua “imensa capacidade de sofrer” em instrumento de luta por
direitos. Bete lutou, além dos seus limites, pela igualdade de direitos, dentro
da categoria de gênero e além, conversando, escrevendo, vivendo e especialmente
estudando a Bíblia.
Na cerimônia do sepultamento, à qual não pude comparecer,
Bete estava vestida com a camisa da Flor de Manacá. Lembramos o quanto ela
falava sobre esse ministério da Igreja do Pinheiro, o quanto uma hermenêutica
bíblica, a partir de um olhar feminista, havia sido libertadora na sua vida. A
palavra “gênero” tão difamada hoje em dia, era seu campo de luta e o acolhimento
a proscritos e proscritas da sociedade era jeito cotidiano de ser.
Pois é, Bete é flor de Manacá, símbolo de beleza e
resistência, talvez flor sempre viva que o câncer não conseguiu impedir de
distribuir profusão de sementes, maneira de se multiplicar em outras flores, e
a morte, para a nossa esperança cristã é apenas caminho para jardins mais
floridos.
Essa é uma penúltima homenagem a Elisabete de Lima Bezerra, diante
de sua família, sua igreja, sua pastora Odja, seu pastor Wellington, e todas as
suas amadas e amados. Penúltima como tantas que virão, porque na teologia de
Dietrich Bonhoeffer, aquele que foi executado pela Alemanha de Hitler, vivemos
aqui e agora o penúltimo, o último é a eternidade.
Maceió, 27 de outubro de 2017.
No último momento, a poesia tão natural e necessária para falar de gente tão querida.
ResponderExcluirQuerida Bete,que viva pra sempre...
Marcos, linda homenagem a Bete. Não a conhecia, mas a beleza do seu texto sugere que ela era mais que especial para te inspirar tão bela reflexão. Abraço, Dimas
ResponderExcluirAmigo e irmão Marcos. Talvez fosse isso o q esperássemos ouvir a cada sepultamento de um servo ou serva de Jesus de Nazaré.
ResponderExcluirMarcos, simplesmente lindas palavras, Bete era isso mesmo que vc escreveu.Ela lutou até o fim e deixou um legado de paz,amor e alegria.
ResponderExcluirUma bela homenagem que reflete a coragem, a bravura da guerreira de Bete que combateu o bom combate!
ResponderExcluirSomente uma pessoa sensível poderia colocar em palavras o q as vezes nos é indizível. Obgda por nos representar nesta homenagem
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