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Marcos Monteiro
As bruxas da Idade Média desencadeavam tempestades,
destruíam colheitas, espalhavam a peste entre animais e seres humanos e, o pior
dos malefícios, causavam a impotência sexual dos homens. Dilma causou uma crise
econômica mundial, atrapalhou a agricultura brasileira, espalhou a chicungunha
pelo povo e o pior de tudo, venceu Aécio nas eleições e tolheu o poder político
de Temer. O poder das bruxas vinha do pacto com os demônios, o de Dilma da
aliança com Lula, que já está sendo exorcizado pela bancada evangélica, com a
ajuda angelical de Cunha, e que será entregue ao braço secular da lei, lá na
cidade de Curitiba.
Quando as catástrofes aconteciam, as bruxas eram denunciadas
e arrastadas aos santos tribunais; muitas, através de promessas, delatavam
outras bruxas, antecipação medieval da delação premiada. Desde a acusação
estavam perdidas, porque as leis de julgamento previam mil e um critérios de
confirmação, com nuances tais quais: o objetivo dos interrogatórios era a confissão,
mas se resistiam a torturas só podia ser com os poderes das artes malignas. Um
dos testes, inclusive, era jogá-las ao mar amarradas a uma pedra, se
conseguissem flutuar eram bruxas.
Portanto, a imensa capacidade de Dilma de resistir às
torturas, antigas e atuais, é sinal de culpabilidade e de habilidade adquirida
de resistir à dor para continuar prejudicando a humanidade. Os julgamentos não
eram apenas punitivos, eram educativos, precisavam alertar o povo para os
perigos da bruxaria e, por anos, havia a peregrinação por igrejas e praças
públicas, manietadas e vestidas de trapos, para servirem de espetáculo público,
sinal visível de que a afronta à alma ameaçava o corpo.
A indignidade do espetáculo que submete Dilma à voracidade
política pode ser comparado somente com a voracidade inquisitorial medieval e,
se a pós-modernidade, é esse espaço em que se encontra de tudo, supermercado
histórico em que o varejo de variedades espalham mercadorias bizarras, a seção
medieval está se tornando cada vez mais popular. As caças às bruxas se
estenderam por mais de três séculos, atingindo a chamada idade moderna, mas a
caça a Dilma adverte que as inquisições continuam e as mulheres ainda são suas
vítimas prediletas. Ou alguém tem dúvida de que a parte mais grotesca desse
espetáculo é produzida por uma misoginia que ainda está entranhada na
existência humana e nas estruturas patriarcais?
A fogueira para Dilma já estava construída bem antes do
começo do julgamento. Esperava-se apenas pela tempestade e pela autorização
angelical de Cunha, porque denúncias já existiam, como existiam nos baús
medievais as denúncias contra as feiticeiras. Hoje há um consenso de que nenhum
argumento, nenhuma apelação legítima livrará Dilma do impeachment. As
mobilizações organizadas e as pressões internacionais não terão força contra a
condenação institucional. Até porque as instituições políticas não têm nada a
ver com manifestações populares, somente quando lhes interessa, e manifestações
populares comandadas pela sociedade civil organizada nunca assustaram o poder
institucional, muito menos quando exercido por corruptos notórios. As pressões
internacionais são pontuais e passageiras e organizarão o seu apoio posterior
em função de vantagens que já desfrutam e que tendem a aumentar.
Restam apenas a geração mais jovem e as futuras gerações que
têm a mania de rever a história e de revolver o solo pantanoso em que estarão
mergulhadas. Pode ser então que ainda lhes reste tempo de revitalizar as raízes
de projetos de uma sociedade menos injusta e que consigam transformações
sérias. A imagem de Dilma queimada injustamente pode voltar então como emblema
de luta. Até porque entre os poderes tenebrosos, algumas bruxas tinham a
capacidade de ressuscitar.
Excelente!! Parabéns!!
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