sábado, 25 de setembro de 2010

Os vôos dos textos

Havia textos no ar
.
Ou revoada de pássaros barulhentos ou silêncio de águia solitária, olhos fixos sobre o seu desejo feito presa.

As estratégias de escrever precisam ser diferentes. Lançar-se destro sobre o esvoaçar colorido ou fugir do veloz predador. Estilo de felino ou de camundongo.

Capturar um texto em seu vôo plástico faz o coração cantar. Segurar com as duas mãos seu olhar expectante, amarrar-lhe linhas e entrelinhas nos pés e devolver-lhe a liberdade azul sem devolver o controle; amizade manhosa de dono.

Mas é preciso fugir do texto caçador.

São textos vorazes que querem lhe devorar as entranhas e que se multiplicam em mil subterfúgios, espalhando armadilhas sobre todos os caminhos.

Há um fascínio mórbido pelo predador. Correr ofegante sobre uma linha de vida, liquefazer o coração gelado e metamorfosear-se em sentimento oblíquo, é apostar carreira com os próprios limites e dar mais um passo à frente para mirar melhor o fundo do precipício.

Era preciso fugir mesmo que inútil. Em qualquer momento o texto lhe abocanha e lhe transporta veloz por luzes e sombras, ignorando suas dores.

Agora, o texto sem pressa lhe arranca o corpo, aos pedaços, enquanto o bico curvo já aponta para o seu coração.

Não há jeito de se desvencilhar, o texto lhe fará sangrar até o fim de sua habilidade de escritor, sem nenhuma compaixão para os seus sofrimentos.

Escolherá o ritmo de devorar-lhe a vida, saboreando devagar cada parágrafo de nojo, cada advérbio de medo.

Havia o olhar sinistro de um texto dirigido para o seu desejo feito presa.

Desde então, era impossível escapar.

3 comentários:

  1. Oxi! Quem entende um texto deste? Só outro louco... Como diz Mazzaropi: Para entender um burro, é preciso ser outro burro também!

    Esse tá dificil! Marcos... menos um pouco. Risos!

    Até mais!

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  2. Interesante suas metáforas para as estratégias de escrever, intensas, textos que se impôem.

    Outros poetas foram sutis, Drummond penetrou surdamente no reino das palavras e elas nas mil faces perguntaram: trouxeste a chave?

    Cabral de Melo Neto, foi mais domestico, comparou escrever a catar feijão, jogar fora o leve o oco e trazer os grãos mais vivos.

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  3. Que os textos em você sejam sempre uma águia predadora devorando a presa. Queremos saborear as suas entranhas e caçar as várias possibilidades de caminhos que os textos tem.
    Adoro os "Linguisticandos"...
    Bjo!

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