Sempre achei que a popularidade do governo Lula transformaria essa eleição em tão previsível que o horário eleitoral seria apenas um balcão de um produto só, em que se vende o mesmo modelo de governo e o mesmo modelo de país, em embalagens um pouco diferentes. Previa também que a elegância dos primeiros pronunciamentos se transformaria em manobras de denúncias e buscas de historietas de baixo nível, pelos candidatos em declínio. Claro que teremos na próxima semana mais e mais informações que tentem ameaçar a vitória no primeiro turno da candidata considerada favorita. Favorita porque favorita do rei, todo mundo sabe, e vamos e venhamos, o rei reinou bem.
Maquiavel dizia que a monarquia precisava ser governada por um príncipe amado e temido ao mesmo tempo. E Maquiavel entendia bem de monarquia por ser republicano. Ou seja, Maquiavel era maquiavélico. Mas Lula, contra uma receita que sempre deu certo, apostou em ser somente amado e reinou por oito anos, amado por todas as classes sociais, incluindo a classe social chamada Rede Globo, amante perigosa, ainda com saudade nostálgica bem disfarçada de amantes antigos, desses com padrão global.
Desde que me entendo por eleitor, começando a votar quando as brechas da ditadura permitiam, sempre votei em candidatos impopulares e quase não elegi ninguém. Fazer Lula presidente com o meu voto parecia resolver um projeto de vida, receber atestado de teimosia militante, tecer afinal a vitória de um governo que implantaria reformas sociais, mesmo que impopulares. Especialmente a reforma ética e a reforma agrária, passos iniciais para um projeto futuro de um socialismo à brasileira, sem medo de ser feliz.
O governo de Lula ultrapassou todas as minhas expectativas: medidas econômicas corajosas, avanços na educação, reformas de infra-estrutura, avanços na saúde, salário mínimo de trezentos dólares, combate radical à pobreza, projetos de desenvolvimento, projetos de habitação, projetos de emprego. Honestamente, esperava muito menos. Mas (sou meio exagerado, confesso) não veio nem a reforma ética (e a crise no judiciário está aí para não me deixar mentir) nem a reforma agrária e a palavra “socialismo” foi simplesmente expurgada (ainda se encontra no dicionário?), tornada maldita pelos “socialismos reais”, para alívio do conforto burguês (essa palavra também é meio antiquada, eu sei).
Apesar de crítico, desenvolvi uma imensa admiração por Lula e sua capacidade de realizar um governo popular (populista?). E não tenho nenhuma saudade da sigla FHC nem de seu partido, PSDB. Não quero nem comentar o escândalo das privatizações, basta-me apenas lembrar do terror das medidas de ajuste da máquina estatal para facilitar a sua venda. O estado transformado em mercadoria em festa de liquidação produzia dores inimagináveis em famílias de trabalhadores. Como pastor, acompanhei síndromes de pânico, surtos psicóticos, crises existenciais, produzidas por um sentimento de insegurança que não era casual; era sabido e utilizado pelos dirigentes do país para acelerar procedimentos na esteira do medo. PDV foi sigla nefasta, capaz de seduzir e destruir projetos de trabalho de pessoas competentes.
O governo de Lula foi infinitamente melhor, mas não fez a reforma agrária, não fez a reforma ética e explicou que “socialismo” era coisa de juventude. Então, resolvi votar em um idoso que ainda crê em mudanças mais radicais do que as atuais; que não tem medo nem vergonha de defender bandeiras impopulares como a união estável de homossexuais ou a descriminalização do aborto, coisas pelas quais sempre lutei. Um idoso que mantém a palavra “socialismo” no vocabulário, até porque acredita na força da juventude.
Decidi votar em Plínio por estar interessado em ver o que seria um governo de coalizão entre “velhos” idealistas e “jovens” sonhadores, essa ainda pequena parcela da juventude que teima em acreditar. Por encontrar nele e em seus partidários pessoas que se arriscam ainda em fazer análises da totalidade social e pensar não apenas em um país melhor, mas em um Brasil melhor dentro de um mundo melhor, um mundo socialista.
Recife, 24 de setembro de 2010.
*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA. Também é coordenador do Portal da Vida e faz parte das diretorias do Centro de Ética Social Martin Luther King Jr. e da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.
Fone: (71) 3266-0055. Veja esse texto também no blog http://www.informativo-portal.blogspot.com/
Marcos
ResponderExcluirConcordo em mtos pontos de vista da sua analise de conjuntura. Vc fez sua escolha. Tb vou de minorias sonhadoras, vou de Marina.
Pr. Marcos,
ResponderExcluirSempre leio seus artigos e gosto de seus pontos de vista, principalmente seu desapego material e sua crítica ao sistema capitalista, nesse sentido o sr. é um sinal de esperança de que existe gente boa que não se dobrou a Mamom. Creio que as leis nunca estão acima do valor da vida.
Não consigo entender apenas seu apoio a união estável de pessoas do mesmo sexo?
Concordo que todo ser humano tem direito de ser tratado com dignidade, pois todos foram criados a imagem de Deus.
Mas a Igreja apoiar o casamento homossexual, não vejo respaldo biblico pra isso.
Concordo com você de que tais assuntos como essa crítica aos movimentos de esquerda partem de igrejas de classe média. E a Igreja necessita sair de sua area de conforto e assumir a causa do pobre e do aflito.
Só tenho essa dúvida meu irmão e gostaria de saber sobre isso.
Não me interprete como crítico pois te respeito e quero continuar te respeitando como homem de Deus que você é.