sexta-feira, 16 de março de 2012

DE INDIGNAÇÃO EM INDIGNAÇÃO




Marcos Monteiro*

Uma indignação permanente na parcela mais crítica de nossa sociedade é o Big Brother, reality show que expõe um grupo de pessoas confinadas em uma casa vigiada por câmeras, disputando um prêmio em dinheiro. Jogo que deve ser jogado por todos para apenas um levar o prêmio, vencedor ou vencedora julgada por um júri invisível formado de milhões de pessoas, cujo resultado é imprevisível.

Indignar-se ainda é uma resposta política possível dentro de um cardápio cada vez menor e acho que o Big Brother merece a nossa indignação. Por outro lado, algumas indignações nossas não são assim tão bem exercitadas. Primeiro, deveríamos dirigir a nossa indignação para a Globo que produz o reality show e mais ainda para todo o sistema de informação, em que as outras televisões, jornais e demais meios de comunicação, não seriam menos dignos de indignação. Examinado com atenção, o Jornal Nacional é mais indignante do que o Big Brother, e os jornais, de um modo geral, merecem o nosso olhar crítico e indignado.

De indignação em indignação as nossas prioridades nos levariam ao Planalto em que certo tipo de reality show também joga um tipo de jogo chamado política. Novamente, não são as ações comezinhas, contingentes, que nos incomodam, nem as regras do jogo que não entendemos bem, mas a própria política em sua face atual.

Para Aristóteles a política é o corolário da ética, mas Aristóteles morreu há muito tempo. Alías, pouco tempo depois, no período chamado ético, participar da política não era considerada ação sensata nem por estóicos nem por epicuristas. Fácil de perceber que o jogo político passara a ser jogado pelos grandes impérios, sendo o romano o mais consistente de todos, espécie de vencedor na Antiguidade.

Na política de Aristóteles, a cidade grega era a extensão da família, no mundo de hoje o Estado é uma ampliação da empresa. Bismarck cunhou a definição de política como “a arte do possível” e Kissinger começou a fazer o possível para beneficiar primeiro o seu próprio país, o que se tornou um modelo de relações internacionais a ser seguido, apesar do acúmulo crescente de indignação que muitas vezes se transformou em ódio.

Na empresa chamada Brasil, herdamos uma gestão que talvez pela primeira vez na história gerou bastante lucro. Curiosa gestão de alguém com passado socialista. A nossa empresa lucrativa é composta de sócios majoritários e minoritários, mas todos somos sócios compulsórios, através da complicada regra dos impostos. Paradoxalmente, os sócios majoritários são constituídos de uma minoria e os minoritários são uma imensa maioria.

O presidente da empresa é escolhido por uma espécie de concurso público com única vaga e poucos concorrentes. Esse concurso chamado “eleição” também se estende para outros cargos importantes, em que alguns candidatos disputam vagas determinadas. A empresa tem suas estranhezas, entre elas a prerrogativa dos funcionários de determinarem os seus próprios salários.

Qual o objetivo do jogo e o que fazem todos os que participam desse reality show? Disputam fatias no astronômico orçamento da empresa. Simples assim. Como toda empresa sabe, os sócios majoritários levarão vantagens nesse jogo, mas como todo empresário entende é preciso dar algumas migalhas para a maioria de sócios, os quais tem pouco poder de decisão, mas são muitos.  Suficientes para se organizarem e mudarem as regras do jogo.

Ética, política e indignação devem ser entendidas e exercidas nesse palco. Infelizmente, diferente do Big Brother, esse jogo não é jogado tão às claras; e na hora do paredão a que são submetidos a cada quatro anos, os milhões de votantes permitem que permaneçam na casa exatamente aqueles que não estavam nem aí para as suas necessidades essenciais.

Feira de Santana, 16 de março de 2012.

2 comentários:

  1. Marcos, sigo indignada com a empresa Brasil, a política e os meios de comunicação. E cada vez mais instigada, inquieta e encantada com sua perspicácia e crítica!!

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  2. Essa indignação proposta por você, Marcos, é o que dinamiza as inventividades de um mundo melhor - sem competições em que o outro é alvo de nossa eliminação, nem pauperizado em detrimento dum pequeno grupo engravatado.

    Gostoso e inquietante texto.

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