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Os acontecimentos de Paris são o resultado de mais um
atentado da humanidade contra a humanidade. O terrorista que corta a cabeça de
um refém e o estadista que dispara um míssil contra o automóvel que transporta
o outro são incluídos nos mesmos noticiários. De algum modo consideram-se essas
ações encadeadas e estadistas e terroristas estão juntos nessa espiral de
violência que produz vítimas por todo o mundo.
Responder ao terror com mais terror tem se mostrado tão
insensato quanto apagar fogo com gasolina e somente tem conseguido espalhar
mais insegurança e mal-estar por todas as partes do planeta. Manter a esperança
em um mundo melhor passa a ser exercício corajoso e enfrentamento crítico das
condições que provocam essa incapacidade da civilização de se parir a si mesma.
Perplexidade e desespero são cada vez mais os sentimentos
naturais e o cotidiano precisa o tempo todo de lugares em que possamos esconder
a vida debaixo do tapete. A cultura de massas multiplica as ofertas de festas e
de artefatos e encena uma outra vida que não essa vidinha monótona de cada dia.
Nesse outro lugar, um outro de nós mesmos exibe para uma multidão de outros e
outras um sorriso escancarado e uma alegria que na primeira oportunidade
escorre por entre as brechas do nosso sentimento de inadequação.
A inquietude que levamos no olhar é resultado de não
sabermos para quem ou para onde olhar. Otimismo e esperança tornaram-se objetos
tão antigos que não temos mais acesso às instruções de como manuseá-los.
Repetir os mesmos erros parece às vezes melhor do que inventar novos e conjugar
o verbo esperançar como propõe Paulo Freire parece tarefa quase impossível,
pelo menos no presente e futuro do indicativo.
Entretanto, a esperança é imperativo existencial, como mais
uma vez nos lembra Paulo Freire, e treinar o olhar para enxergar além da
evidência se impõe como necessidade urgente e tarefa cotidiana. O desfile de
imagens da catástrofe de Paris propugnado pelos meios de comunicação nos
convida de imediato às atitudes de empatia e compaixão, sem as quais é impossível
estabelecer sociedade, mas também a uma análise criteriosa dessa civilização
global em suas contradições. Uma declaração de guerra ao terror que acompanha
as imagens coloca todo o planeta em estado de sítio, exatamente porque o terror
não tem fronteiras.
Um atentado e uma declaração de guerra têm sempre
assinaturas o que faz a violência anônima, quotidiana e estrutural ficar em
segundo plano, embora as estatísticas sejam assustadoras. A violência em tempos
e lugares de paz é muito maior do que a violência da guerra e as vítimas do
sistema não são consideradas. Desigualdades, opressão, injustiça, exploração e
discriminação são raízes invisíveis dos espinhos que se espalham por toda a
parte e tudo isso é estrutural, mas raramente se raciocina desse modo, até
porque dentro dessa lógica, estadistas e terroristas estão mais próximos do que
desejaríamos.
Interessante de notar como, editando imagens e notícias, os
meios de comunicação editam também os nossos sustos. A partir de hoje, por
causa dos terroristas, torna-se inquietante assistir a uma partida de futebol,
ir a um espetáculo musical ou simplesmente caminhar pelas ruas, em Paris ou nas
grandes cidades do mundo. Entretanto todas essas atividades em si mesmas já
geravam certa inquietação, dadas cenas de violência que acontecem repetidamente
em lugares assim. Mas houve uma cena realmente assustadora que não causou tanta
repercussão.
A imagem é a de um automóvel destruído por um míssil lançado
de um avião não tripulado. Um estadista norte-americano autoriza a destruição
de um terrorista árabe, com a garantia do serviço secreto que dava como praticamente
certa a presença do mesmo no carro. Não nos informam sobre os outros
passageiros ou passageiras e não nos advertem sobre esse imenso poder de alguém
ter a capacidade de causar destruição a distâncias intercontinentais a partir
de informações quase precisas. Também isso é um atentado da humanidade contra a
humanidade e dirigir um automóvel em qualquer lugar da terra pode nos tornar
alvos de operações de guerra, especialmente se formos confundidos e
classificados como terroristas.
Em Paris há dores demais e
sofrimentos demais para que não nos sensibilizemos. Mas precisamos todos e
todas mudar as raízes do mundo em que vivemos. As dores que sofremos não são
dores de parto. A estrutura capitalista em que estamos mergulhados não é o
útero de um mundo melhor, mas o calabouço de nossas melhores motivações e de
nossos maiores ideais.
Amigo, só tenho dores a compartilhar... Triste o mundo em que estamos. Obrigada pela reflexão.
ResponderExcluirEnquanto ELLES brincam de Guerra,nós trabalhamos dia à dia por Igualdade Liberdade e Fraternidade.
ResponderExcluirTão difícil fazer a reflexão sobre guerra e paz. A humanidade está doente, contaminada com tantos "ismos" de A a Z: animalismo, autoritarismo, afanismo, antidemocratismo, autofagismo, anomalismo, charlatanismo, coisismo, cinismo, ceticismo, covardismo, conservadorismo, capitalismo, consumismo,egoísmo, fascismo, fanatismo, machismo, militarismo, miopismo, nevralgismo, obscurantismo, parasitismo, peleguismo, pseudobrasileirismo, politiquismo, reacionismo, retrogradismo, visionismo, terrorismo, xenofobismo...que já nem sei mais se acharemos a cura para tantos males...
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