quinta-feira, 16 de outubro de 2014

UM DEBATE DE AÉCIO CONTRA AÉCIO



Marcos Monteiro

A performance de Aécio Neves no primeiro debate do segundo turno foi tão ruim que me deu a impressão de que qualquer que fosse o interlocutor ele sairia perdendo. Se ainda assim conseguir ganhar essa eleição, teremos de admitir que a direita é tão poderosa e tão capaz de reação que consegue eleger até mesmo Aécio.

Típico candidato que me passa a impressão de que se fosse candidato único sairia em segundo lugar. Aécio conseguiu ser ruim em postura, compostura, estratégia, argumentação, discurso e imagem. Dilma bastou ser ela mesma, com aquele discurso firme (quase rude) e monocórdio, com aquela postura de primeiro sargento ou de professora de escola primária do interior (dessas que a gente agradece pela autoridade incisiva na formação de nosso caráter), para derrotá-lo e desmontá-lo fragorosamente.

No último debate do primeiro turno, Aécio passou a impressão de aluno traquinas, criança criativa capaz de enfrentar adultos monótonos, arrancando esperanças e sorrisos de toda a classe.

Nesse agora, a criança parecia na verdade é que era mal-educada e incompetente, cada vez mais insegura diante do carão da professora, incapaz de se defender de modo convincente e apelando muitas vezes para a ofensa gratuita e descortês. Muitos de nós tivemos a impressão de ele estar perto de um descontrole, prestes a partir para a agressão física, o que não seria novidade para algumas pessoas.

Algumas de suas atitudes no debate ainda me deixam perplexos. Chamar a adversária de mentirosa e pronunciar mentiras tão fáceis de se encontrar, como a afirmação de nunca ter perdido uma eleição em Minas Gerais e não ter nenhum parente em sua administração, por exemplo.

A difusão de informações no complexo virtual deveria ter deixado o candidato mais cuidadoso porque agora basta consultar os aplicativos de pesquisas para conferir certas afirmações. Agindo do jeito que agiu correu o risco de transformar questões pequenas em grandes e de passar a imagem duvidosa que passou para qualquer eleitor.

As famosas propostas novas de Aécio são continuar os programas sociais e manter os avanços em todos os setores, ou seja a mesma proposta da adversária. A diferença seria a capacidade de gestão que sua argumentação e sua postura não confirmavam e a sua “limpeza” moral que também não encontra respaldo nem mesmo entre seus apoiadores e aliados.

Desse modo, não consigo entender o grande apoio da elite conservadora (que não tem perdido nada no atual governo) para o seu projeto. Talvez o que Aécio não diz seja o mais decisivo.

O grande novo momento que preconiza e que não explica claramente como será, parece ser a velha solução de cortar salários, reduzir concursos públicos, diminuir ganhos da população mais carente e se aliar mais fortemente aos mercados hegemônicos, com mais subserviência do que nunca às pressões internacionais.

Isso deixa para muitos de nós a sensação de que as melhores empresas e os maiores bancos do país correm sérios riscos. Suas costuras e encaminhamentos nos deixam com essa impressão e suas respostas não são claras.

Aliás, a falta de clareza predomina em todos os seus projetos. Sua solução para a segurança não passa de aumentar penas criminais e de por mais polícia nas ruas, solução tão popular quando inofensiva diante da grande questão da violência urbana. Parece propor resolver a questão da violência com mais violência.

Aumentar penas para crianças pobres é muito fácil e conta até com grande apoio popular (apoio lamentável e duvidoso), mas para quem parece tão indignado com a corrupção não passou pela sua cabeça em nenhum momento transformar a corrupção em “crime hediondo e inafiançável” e aumentar a pena para corruptos e corruptores.

Desviar dinheiro de saúde, educação, saneamento básico e outros serviços públicos, atinge milhões de pessoas e causa mais mortes do que a ação de crianças e adolescentes infratores. Mas tais atividades fazem parte do histórico de famílias poderosas e isso seria tão corajoso quanto taxar as grandes fortunas.

Bem, não quero me alongar em considerações, afinal votei em Luciana Genro no primeiro turno, mas claro que votarei em Dilma agora. Especialmente diante do risco da volta de um governo tucano.

Mas quero lamentar o esboço de um apoio evangélico a Aécio, por parte de amigos e companheiros de lutas que aprendi a respeitar. Não consigo entender isso.

Entendo quando pessoas como Silas Malafaia e Marco Feliciano fazem os seus pronunciamentos preconceituosos e limitados. Mas não entendo outros pronunciamentos. Também não consigo entender Marina Silva em suas últimas trajetórias. Qualquer que seja o resultado dessa eleição, a impressão que me dá é que ela perdeu o caminho e se perdeu de si mesma.

Feira de Santana, 16 de outubro de 2014

*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA e também é um dos pastores da Primeira Igreja Batista em Bultrins, Olinda, PE. Faz parte da diretoria da Aliança de Batistas do Brasil e é membro do Portal da Vida e da Fraternidade Teológica Latino-Americana.
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.
Fone: (71) 3266-0055. Veja esse texto também no blog www.madoniram.blogspot.com.


2 comentários:

  1. Camarada, estava aguardando sua fala há semanas. Você é sempre um pastor como deveria todos serem, mostra o quanto é controlado e prudente, ama e por isso nos alerta. Obrigado Marcos. Destaco: "Aumentar penas para crianças pobres é muito fácil e conta até com grande apoio popular (apoio lamentável e duvidoso), mas para quem parece tão indignado com a corrupção não passou pela sua cabeça em nenhum momento transformar a corrupção em “crime hediondo e inafiançável” e aumentar a pena para corruptos e corruptores."

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  2. Cara, esse seu texto é o máximo. O mais legal é que no início parece irônico e cômico, porém muito sério e verdadeiro, prova que esse candidato é realmente uma fraude. Todos os tucanos falam do mesmo jeito, vejo a imagem de muitos "pregadores" de igreja, parece que aprendeu com os "evangélicos" esse tipo de oratória... Massa essa frase: "Típico candidato que me passa a impressão de que se fosse candidato único sairia em segundo lugar."

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