sexta-feira, 27 de setembro de 2013

O PETRÓLEO É NOSSO. QUEM DÁ MAIS?

rededemocrática

*Marcos Monteiro

A descoberta de reservas de petróleo no fundo do mar de Santos, o famoso pré-sal, foi uma dessas descobertas fenomenais capazes de gerar assanhamento de tantos jeitos em tantos lados. Uma projeção de autonomia energética de cerca de cinquenta anos, na delicada área dos combustíveis fósseis, é alentador para esse país que pertence a um planeta em que a escassez do precioso líquido se aproxima velozmente. Os produtos do petróleo construíram a nossa civilização atual e o desaparecimento futuro dessa fonte energética significa o redesenhar de toda uma estrutura. Claro que há problemas na utilização do petróleo e seus derivados, mas não podemos imaginar o que será o mundo sem eles.

O direito de prospecção e de industrialização do petróleo foi resultante de lutas de vários setores da nossa sociedade que concordavam (às vezes somente nisso) em garantir para o futuro autonomia e soberania nacional. O slogan “O petróleo é nosso” era a bandeira desse movimento. Nomes como o de Monteiro Lobato estiveram associados a essa reivindicação, tendo o mesmo criado situações no famoso “Sítio do Pica-pau Amarelo”, em que todas as suas personagens se uniam para defender o petróleo, pretensamente descoberto no sítio, dos sutis interesses estrangeiros.

Houve um momento de moda na propaganda internacional em que privatizar era ser moderno diante do atraso de nacionalismos vazios e se privatizou de tudo com consequências difíceis de se analisar. Algumas iniciativas estatais e a teimosia de se manter bancos e empresas como a própria Petrobras no âmbito de gestão do Estado levantam suspeitas sobre a real necessidade de se privatizar telefonia e outros serviços. Os lucros de empresas como a Vale, depois de privatizadas, não seriam necessariamente benefício para a nação. Afinal, lucro é somente um dos mecanismos de concentração de renda mais eficazes do sistema. Além de que, o modo como aconteceram as privatizações terem sido motivo de análise e denúncia sobre vantagens espúrias de intermediários.

Sabemos que se movimentar dentro da complexidade da pressão capitalista não é alguma coisa fácil e a necessidade de crescimento estrutural e a demanda por serviços básicos empurram as administrações para buscas de parcerias que constituem uma negociação entre diversos interesses. Petróleo é mercadoria cada vez mais rara, possivelmente cada vez mais cara. Diante disso, um leilão parece óbvio, e parece que se garante um leque de vantagens para o vendedor, no caso o Brasil. O fato de gigantes privados do setor não se interessarem em participar parece bom sinal.

Mas não tem como se evitar o sentimento de perplexidade. Estamos vendendo o nosso petróleo, ou como dizemos no título: “O petróleo é nosso. Quem dá mais?”. Apressamento e precipitação são quase sinônimos e o esforço de todo um grupo de agentes respeitáveis do movimento social assinarem uma petição para embargar o leilão deve ser levado em conta. Ainda mais quando o fato não parece receber destaque da mídia. A mídia sempre teve mais facilidade de fazer o jogo do setor privado.

Os movimentos sociais não têm sido felizes em sua interlocução com o governo. Esses que pareciam ser companheiros naturais para a gestão atual perdem cada vez mais força diante de outras pressões. E quando se trata dos grandes eixos da política econômica raramente são ouvidos ou valorizados. Entretanto, seus pronunciamentos críticos devem ser entendidos como dos mais confiáveis por lembrarem a interligação de todas as coisas e por desejarem sempre mais participação popular, portanto mais democracia.

O petróleo é nosso, mas agora teremos parceiros que nos pagarão bônus e royalties para aplicarmos nas nossas necessidades mais urgentes. Isso será uma espécie de mini-privatização e uma janela para ingerência externa nas nossas decisões nacionais. E tudo no campo energético, crucial para toda a humanidade. Pode até ser que essa seja a melhor decisão dentro da conjuntura atual, mas, como toda opção, nunca poderemos saber como teria sido diferente. O que sabemos é que a decisão vai ser tomada apesar de tudo e de todos.

Os movimentos sociais não serão ouvidos mais uma vez, fosso que se vai colocando em uma comunicação cada vez mais truncada. Achamos mais petróleo e o convertemos em moeda para comprar mais infra-estrutura, mais saúde e mais educação. Entretanto, parece que não temos nenhum projeto em andamento para a prospecção de um poço de onde possa jorrar mais democracia.

Feira de Santana, 27 de setembro de 2013.

*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA e do grupo de pastores da Primeira Igreja Batista em Bultrins, Olinda, PE. Também faz parte da diretoria da Aliança de Batistas do Brasil e é membro da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil.
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.

Fone: (71) 3266-0055.

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