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Gn 48-50
A morte de Jacó encerra o livro
de Gênesis. Narrativas sobre conversa coloquial com o Faraó, relações familiares,
bênçãos, cerimônias fúnebres dignas de um patriarca, quase oitenta dias em
lugares diferentes com os mais importantes oficiais do Egito, choro que nunca
se acaba, como era de praxe, medo de vingança dos irmãos e perdão de José que
diz:
“Vós, na verdade, intentastes o mal contra mim; porém
Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve muita gente
em vida” (Gn 50,20).
Javé é um Deus que de modo
misterioso transforma o mal em bem.
Mas o ponto mais alto da
narrativa é o momento em que Jacó, no leito da morte, distribui e pronuncia
bênçãos.
Uma tradição bem antiga concebe
que o homem na hora da morte torna-se vidente. A morte seria plenitude de
entendimento, momento culminante de sabedoria, compreensão que se abre sobre
todas as coisas sem limites. Nas bênçãos, Jacó se encontra em limiar. Entre
tradição e possibilidades, entre este mundo e o mundo dos mortos, entre passado
e futuro.
Portanto, quando José traz seus
filhos para a bênção, Jacó subverte a ordem patriarcal e carrega de bênçãos o
mais novo, Efraim, deixando o primogênito, Manassés, em segundo plano. Ele próprio
se torna patriarca por meios indiretos, não por direito de primogênito. Esses
netos se tornam filhos por amor a José, o filho da amada Raquel, de quem lembra
a morte.
“Vindo, pois, eu de Padã, me morreu, com pesar meu,
Raquel na terra de Canaã, no caminho, havendo ainda pequena distância para
chegar a Efrata.” (Gn 48, 7a).
A amada morre a caminho, mas a
saudade, a lembrança e o pesar caminham até o final de sua vida.
Na distribuição de bênçãos sobre
os filhos vislumbra a futura organização tribal e a vindoura instituição
monárquica, colocando Judá acima dos irmãos.
“O cetro não se arredará de Judá, nem o bastão de
entre seus pés, até que venha Siló; e a ele obedecerão os povos” (Gn 49, 10).
A bênção se move entre passado e
futuro, acerto de contas e promessas. De Ruben cobra o desrespeito de haver
dormido com uma das concubinas do pai. De Simeão e Levi, a violência. Com
metáforas de animais, compara Judá a um leão, Issacar a um jumento que trabalha
sem parar, Dã a uma serpente à espreita na beira do caminho, Naftali a uma
gazela, correndo livre e proferindo palavras formosas, e Benjamim a um lobo que
despedaça a presa. Zebulom estará nas praias e será porto para navios, Gade
será hábil em guerras e guerrilhas, Aser será campo de abundância e José será
ramo frutífero, galhos sobre os muros que resistem aos frecheiros.
As bênçãos assumem uma forma
poética e são postas a partir de Javé e sob a responsabilidade do mesmo. Na
hora da morte Jacó se torna vidente. O vidente é aquele que enxerga o que Javé
fez e vai fazer na história. A sua forma de falar é poética, porque quando Javé
fala não escolhe a linguagem ordinária, escolhe a poesia.
Javé é o poeta que intervém na história de maneiras
intrincadas para buscar um mundo sempre melhor.
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