terça-feira, 3 de setembro de 2013

A crônica falta de crônica

gauchaopina

Cronicar ou não cronicar torna-se a questão de quem ousa se oferecer como texto para um reduzido mas exigente público leitor.
           
Precisa-se da idéia e às vezes a idéia vem, simplesmente, sem pedir licença e espalha-se ela mesma como organização lógica de palavras, frase por frase, parágrafo por parágrafo, atrevidamente, dispensando totalmente o autor.
           
Às vezes, simplesmente a idéia não vem.
           
Então, é preciso usar mão do repetido recurso de se escrever sobre o não escrever, usar a falta de assunto como o próprio assunto e ousar a metacrônica, ou a metanãocrônica, a crônica sobre a crônica falta de crônica.
           
Inspirar-se é encher a imaginação das idéias que estão no ar, ou talvez se encher do ar das idéias. Não se inspirar é trocar a inspiração pela suspiração, encher o pulmão nervosamente do poluído e concreto ar cotidiano. Ousa-se a metacrônica (ou a metanãocrônica) com um suspiro de resignação que espera pelo suspiro de alívio do final da crônica.
           
Porque o final é o problema maior de toda crônica e finalizar uma metacrônica talvez seja o maior desafio do excessivamente atrevido metanãocronista.
           
Claro que a metacrônica tem os conhecidos desafios do estilo, tonalidade, conotação, precisão da crônica. Como a própria crônica, a metacrônica pode ser ou irônica, ou lírica, ou lógica, ou divertida, ou tudo isso. Mas, como a crônica, a metacrônica (metanãocrônica?) precisa de um convincente final.
           
O problema do final é tão óbvio que o cronista tem vergonha de explicar. O final não pode vir no começo, nem no meio, mas apenas no fim. Mas como discernir? Estamos no início ou no meio de nossa atrevida metacrônica?
           
Também o final não pode vir depois do fim. Claro? Nenhuma crônica, ou metacrônica, ou metanãocrônica pode ser um incessante recomeçar (a não ser como ousadia estilística ou como transgressão intencionada).
           
O objetivo da crônica é descrever do modo mais breve possível a presença da idéia. A metanãocrônica precisa se alongar o mais possível sobre a ausência. Mas ambas se encontram diante do desafio da precisão, o que nos remete mais uma vez ao final.
           
Finalizar ou não finalizar torna-se agora o último e urgente desafio de quem se arrogou desde o início a cronicar sobre o não cronicar. Poderia encontrar um clímax para a nossa ousada metanãocrônica, ou um anticlímax. Ou um final surpreendente ou a surpresa do não-final. De todo o modo, acabamos por aqui mesmo, em uma espécie de metafinal, ou um metanãofinal para uma metanãocrônica.

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