Pela televisão assistíamos juntos a um jogo de futebol, quando alguns jogadores apareceram com aquele esparadrapo no nariz. Jeito de tornar o ar mais respirável e acrescentar resistência a ritmos de jogo, descobertas que a ciência acrescenta para dar maior suporte a habilidade de atletas. Mas aí, Seu Madeira começa uma de suas introduções para a história do histórico time Maravila F. C., o maior time de futebol de todos os tempos. Todo o mundo na Vila garante que ainda hoje o time atual é o maior do mundo, somente não disputa esses títulos espúrios e oficieiros, Mas o time antigo, o do Roído e do Biu do Efeito, suas referências máximas, indiscutivelmente não divide essa glória com mais ninguém.
Seu Madeira garante, naquele seu jeito próprio de contar casos, que foi o Maravila o primeiro time do mundo a usar o recurso do esparadrapo para fins de respiração e discorre diante do pequeno auditório, agora mais atento à história do que ao jogo, sobre os fatos que geraram o recurso, e isso significou estratégias de jogo entre João Cirilo, o técnico cabra safado do Ipiranga, e Aroeira, o inventivo técnico do Maravila F. C. Que João Cirilo tinha recursos não nega, até porque o mal não conhece regras nem limites, mas Aroeira sabia se defender de uma maneira elegante, sem nunca sair da linha.
Um dos principais recursos de João Cirilo foi Manezinho do Bolo, atacante que apareceu subitamente em uma única partida, e foi usado para desestabilizar a defesa do Maravila. Bom de bola, mas estatura mediana e um pouco gordinho, cabeceava normal, driblava normal e chutava normal, mas tinha uma habilidade toda especial.
O chute era normal, bem colocado mas fraco. Goleiro sempre pegava, às vezes com alguma dificuldade. O drible normal era aquele curtinho, mais proteção de bola do que outra coisa, mas o físico não ajudava muito e o zagueiro sempre terminava levando a melhor. Cabeceava bem, mas não pulava muito, o que não ajudava nada no desestabilizar as defesas do adversário. Então, qual era essa habilidade especial que João Cirilo tanto apreciava e preparara secretamente para aquela partida? Manezinho do Bolo peidava como ninguém. Distribuía bufas, traques e peidos no campo do adversário, causando verdadeiro terremoto a atarantados oponentes.
Bufa, todo mundo sabe, é aquele fedorzinho que vai se espalhando silencioso até tornar qualquer ambiente irrespirável. Traques são aqueles ruídos rápidos de explosões gasosas, uma atrás da outra, incomodando ouvidos e narizes, algumas vezes provocando gargalhadas incontroláveis. E peidos são peidos. Petardos sonoros, assustadores, que espalham um mau cheiro tão mau que paralisa qualquer zagueiro bem concentrado. Loureiro era perito em contato corporal, jogava duro, bem naquele limiar imediato antes da falta, mas tinha uma sensibilidade olfativa que Manezinho desestabilizava e cometeu falta atrás de falta, até mesmo um pênalti, desperdiçado milagrosamente pelo cobrador do Ipiranga. Seu Madeira não tem certeza, mas acha que foi o Milicunha.
Aroeira, técnico do Maravila, não conseguia entender o que se passava e quando terminou o primeiro tempo, o jogo continuava zero a zero, talvez por providência especial dos deuses do futebol, provavelmente irritados com as artimanhas pouco esportistas de João Cirilo. Além do pênalti perdido, o Ipiranga já colocara seis bolas na trave e Aroeira contara onze defesas milagrosas de Terêncio, o goleiro contorcionista e exibicionista, todo feliz por poder demonstrar seus dotes espetaculares. Ele tinha sido o grande nome do jogo no primeiro tempo.
No segundo tempo, todos os jogadores voltaram com esparadrapos no nariz, embebidos em um perfume muito agradável e muito forte que Aroeira encomendara às pressas para combater a estratégia do adversário. Portanto, a atual mania tem precedentes, como não podia deixar de ser, no passado do Maravila F. C, guardado cuidadosamente na memória do Seu Madeira, transcrito pouco a pouco por minha mania de escrever.
Que a contra-estratégia deu certo nos diz o placar final. O Maravila mais uma vez ganhou o jogo, pálido um a zero, mas ganhou. Ganhou também a inventividade do bem, capaz de enfrentar as invectivas do mal.
Manezinho do Bolo, o famoso jogador peidador, tão eficiente em sua arte que se, o saudoso que não deixou saudades, Sadam Hussein, tivesse um único soldado iraquiano em suas fileiras com aquela capacidade não teria precisado pesquisar armas químicas, acabou sendo expulso e nunca mais foi escalado nem para jogar botão. Primeiro, levou um cartão amarelo daquele mesmo juiz, Epifânio, descendente dos gloriosos Araújo Brito, por uma bufa que chegou às suas meretíssimas narinas e ele considerou desrespeitosa. O cartão vermelho veio depois de um peido tão alto que todo mundo ouviu e tão fedorento que nem o juiz agüentou. A expulsão foi registrada em súmula e o motivo alegado pelo pomposo Epifânio foi “flatulência descompensada”.
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