conversafiada |
Marcos Monteiro
No dia 16 de março a Rede Globo
começa uma nova novela de horário nobre, um dia depois das manifestações
marcadas para domingo. Produtora de novelas premiadas mundialmente, a Globo é a
difusora maior no Brasil da sociedade do espetáculo, em que a aparência e o
simulacro são o que realmente importa. Entender a novela “Brasil” produzida
diariamente por essa emissora especialmente não é tarefa fácil e somente na
segunda-feira, talvez, possamos saber se as manifestações de domingo são parte
de uma tragédia ou de uma comédia.
Talvez eu tenha vivido demais ou
de menos para ter capacidade de compreender o momento atual. Tenho mais de
sessenta anos e menos de quinhentos, e um acontecimento torna-se mais
compreensível com o distanciamento histórico. Talvez o século XXI seja para a
história da humanidade o equivalente do que significou o século XVI, por
exemplo. Mas não temos ainda como saber. O jogo político e econômico jogado
agora tem elementos complexos e obscuros e as lições do passado parecem
insuficientes para um bom esclarecimento da situação presente.
Por tudo isso, o nosso
posicionamento vai ter o gosto da perplexidade e do direito de levantar
questões.
As manifestações de domingo próximo
começaram como uma brincadeira de criança, um joguinho na internet, que foi
tomando proporções drásticas com a possibilidade de se tornar parte daqueles
jogos virtuais em que os jogadores correm riscos. Tem sido alimentada por
estranhos pronunciamentos e por difusão de boatos e a imprensa conservadora gostaria
muito de explorar tais manifestações. Segunda-feira saberemos a quanto estamos.
Por outro lado, é impossível
minimizar a insatisfação popular espalhada por todos os cantos, legítima e
estranha ao mesmo tempo, tenha sido estimulada ou não pelos meios de
comunicação. O mal estar e sentimento de desconforto é próprio de uma sociedade
capitalista que promove e premia o individualismo, a competição e a
desigualdade, enquanto acena para um conforto e bem estar sem precedentes. Tipo
de organização social que nunca consegue cumprir suas promessas.
Canalizar essa insatisfação
generalizada e sistêmica para um governo e um partido com os seus equívocos é
tarefa relativamente fácil, mesmo sendo estranho que boa parte dos indignados
têm sido os mais beneficiados por medidas e providências que promoveram uma
maior inclusão social. A intervenção oportunista de grupos conservadores é algo esperado. Mas
não sabemos ainda se estamos diante de uma conjuntura tipo anos sessenta em que
a batalha de manifestações nas ruas entre progressistas e conservadores
alimentou um golpe militar e uma ditadura.
Não sabemos de boa parte do que
acontece nos bastidores do espetáculo. Mas sabemos que a Rede Globo não é bem
uma central de informações, mas uma difusora competente de teledramaturgia nada
ingênua. Toda a sua programação, incluindo os telejornais, são peças teatrais
bem construídas. Detendo a hegemonia da comunicação no país, consegue a
contratação dos melhores atores.
Um jornalista da Globo é na
verdade um excelente ator, contratado para repetir um texto que não lhe pertence,
e para assumir a postura e o tom de voz adequados a uma emoção que pertence à
personagem que representa. Sua pose de indignação ou o seu riso discreto são as
garantias de seu excelente salário, funcionário privilegiado e ator estratégico
dessa antiga novela.
Não sabemos ainda a força das manifestações do próximo
domingo, mas sabemos que serão parte da produção de novelas da Globo, o que nos
deixa um tanto apreensivos. A competência de produzir teledramaturgia dessa
emissora, me leva a imaginar que ela deveria algum dia fazer uma novela sobre a
própria Rede Globo. E para ser sucesso total, deveria garantir um final feliz
para todos os vilões.
*Marcos Monteiro é assessor de
pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da
Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA. Também é um dos pastores da
Primeira Igreja Batista em Bultrins, Olinda, PE e é membro da Fraternidade
Teológica Latino-Americana e da Aliança de Batistas do Brasil.
CEPESC – Centro de Pesquisa,
Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.
Fone: (71) 3266-0055.
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