sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O JULGAMENTO DO SUPREMO

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*Marcos Monteiro

O título acima serve tanto aos atos processuais julgados, como ao tribunal que julga. O julgamento do supremo é o acontecimento processual que ocorre publicamente e o julgamento do supremo é o juízo que a opinião pública exerce sobre o órgão máximo de nosso sistema judiciário. E o supremo está sendo julgado todos os dias.

A superexposição que a mídia organizou sobre o julgamento do “mensalão” tornou visível a complexidade do nosso sistema judiciário, dentro do complexo jogo político que se joga todos os dias. As câmeras têm o efeito amplificador de disponibilizar discursos e imagens para todos os lados e alimentar conversas pessoais e redes virtuais. O resultado de tudo isso é difícil de prever, mas podemos ponderar sobre alguns pontos no momento, especialmente a relação entre justiça e corrupção.

A corrupção é coisa presente em todos os lugares do mundo e no Brasil é histórica e endêmica, atestada pelas narrativas sobre a invasão e colonização europeia. A troca de bugigangas por riquezas naturais que marcou o início do processo de invasão e gradativo genocídio das populações nativas ainda parece ser o emblema das relações de poder. Oferecer ilusões como mercadorias necessárias é típico do jogo de sedução do Capital, modo novo da antiga colonização e exploração.

Desse modo, exercer justiça nos moldes clássicos é esperar demais da sociedade brasileira. Mesmo a questão chamada justiça, definida como a mais completa das virtudes, espécie de árbitro e mentor de todas as demais, não tem solução definitiva. Calcular a medida certa, dentro daquele ideal grego, ou o ponto do meio entre perdas e ganhos, não cabe numa equação de matemática. A existência, em sua contingência concreta, ultrapassa toda arquitetura algébrica.

Então, o jeito é assistir o jogo e tentar entender as jogadas de cada lugar. Tentar entender por exemplo porque o chamado “mensalão” tem sido constantemente chamado de “o maior escândalo de corrupção da história do país”. Em um certo sentido, isso tornou-se verdade, a partir do momento em que vários setores do poder se juntaram para divulgar indignação em cima de indignação. Indignação que não aconteceu diante de tantos outros esquemas de corrupção como a chamada “privataria tucana”, por exemplo. Há um certo sabor de justiça quando o supremo se ocupa com esse caso específico, mas gostaríamos de saber porque nunca vimos o mesmo tribunal se ocupar com outros.

Dessa maneira, dificilmente podemos acreditar na neutralidade e racionalidade da justiça. Aliás, neutralidade e racionalidade não acontece em lugar nenhum de nossa vida. Somos seres políticos, temos opinião e tomamos partido, e somos seres apaixonados. Admitir isso, é o primeiro passo para emitirmos qualquer juízo. Discursamos de um lugar interessado e o fazemos como oradores apaixonados. Isso explica tanto a diversidade de opiniões do supremo, quanto a nossa diversidade cotidiana de opinião.

Todos desejamos que a justiça continue julgando a corrupção, toda a corrupção. Mas desejamos que a corrupção da própria justiça também seja julgada. Não há corte institucional acima do supremo, portanto não há poder institucional para julgá-lo. Mas, se numa sociedade democrática, todo o poder emana do povo, precisamos tanto de democracia mais efetiva quanto de povo mais bem organizado. Essas duas coisas sempre andarão juntas.

Feira de Santana, 20 de setembro de 2013.
  
*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA e do grupo de pastores da Primeira Igreja Batista em Bultrins, Olinda, PE. Também faz parte da diretoria da Aliança de Batistas do Brasil e é membro da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil.
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.
Fone: (71) 3266-0055.

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