sexta-feira, 9 de agosto de 2013

A ESTRUTURA DA DESINFORMAÇÃO

fotolog


Marcos Monteiro*

Misturar novela e jornal nacional é ensombrecer os contornos entre ficção e realidade, bem como acompanhar programas de humor e de reportagens significa confundir comédia e tragédia. Ficamos entediados ou indignados com os quadros humorísticos, mas desatamos de rir diante de reportagens e notícias, exatamente como cegos em cinema: gargalhando em catástrofes e chorando nas piadas.

O grande aparato de divulgação, chamado de “o quarto poder”, tem o objetivo de mascarar a informação, fazendo recortes que excluem o que não interessa, talvez aquilo realmente importante.

Denunciar alguém significa quase sempre proteger alguém e se indignar diante de crimes significa ocultar crimes e desviar suspeitas. Isso exige do profissional da informação uma certa habilidade que causa a confusão de gêneros, porque o mais hábil dos roteiristas não seria capaz de proporcionar os espetáculos que o jogo de interesses produz.

Que escritor de comédias seria capaz de produzir a gafe de um veemente comentarista político afirmar uma coisa e noutra ocasião o seu contrário?

De igual modo, o mais inventivo dos romances de espionagem não têm roteiros parecidos com a descoberta de uma fantástica atividade de vigilância produzida sobre uma incalculável massa de cidadãos comuns. E mais, o final de tudo seria digno de uma comédia, assim meio paródia. O líder do sistema de espionagem termina muito bem e quem denuncia o esquema tem de perambular pelo mundo em busca de proteção.

São divulgadas notícias de crise crescente na Europa e nos Estados Unidos e ao mesmo tempo importados exemplos desses lugares para serem aplicados aqui. Estamos tão acostumados com essa confusão que quando se fala de que precisa se humanizar o mercado e dar uma função social ao capitalismo, ninguém se contorce de tanto rir. A frase é de natureza tão esdrúxula quanto qualquer roteiro (de Spielberg naturalmente) de domesticação do “tiranossauro rex”.

O sistema capitalista é naturalmente predador, estruturalmente concentrador de renda e de poder. Portador de uma fome voraz ocupa todos os espaços possíveis para garantir a sua gula. Financia artistas, políticos, pensadores, jornalistas, para representarem os papéis de seu roteiro e para modelarem a sua imagem. Pintar o dragão de rosa não é súbita inspiração de cinematografia, é tarefa cotidiana de toda uma equipe muito bem paga.

As diferentes rodadas de discussão e de informação são organizadas por pessoas que pertencem à parte de cima da pirâmide e comumente são sobre pessoas do mesmo nível e lugar. Denúncias de jornalistas contra políticos são via de regra acusações de milionários contra milionários, crise interna que continua mantendo a lógica de desigualdade do sistema. Os editores de notícias, quase sempre, não conhecem filas nos SUS nem andam de ônibus. Movimentam-se em um espaço e em um tempo diferentes dos demais. Nesse confuso mundo, mocinhos e bandidos precisam estar sempre sob vigilância crítica.

Desse modo, escamotear a realidade não é falta de conhecimento nem falha na postura profissional. Pelo contrário, precisa-se de que o sistema continue sendo o mesmo, talvez com pequenos ajustes, para que continue a favorecer uma minoria. O sistema precisa das sombras e das entrelinhas, sua necessidade vital é não dizer. A desinformação, por conseguinte, é estrutural.


*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA e do grupo de pastores da Primeira Igreja Batista em Bultrins, Olinda, PE. Também faz parte da diretoria da Aliança de Batistas do Brasil e é membro da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil.
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.
Fone: (71) 3266-0055.                      

            

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