Quanto vale o amor
Gn 29, 1-30
O patriarca Jacó que funda a
nação de Israel não seria exatamente um herói, mas um anti-herói, matreiro e
astuto, que usa as armas dos menores para prevalecer.
Simpática personagem porque
gostamos dessas figuras populares, cheias de truques, enfrentando a violência
do direito com a força da artimanha. Não têm objetivos de mudar o mundo ou de
reinventar a vida. Tudo que fazem é viver da melhor maneira possível.
Nesse episódio, pela primeira
vez, nosso herói (ou melhor anti-herói) encontra um revés. Fraqueza de todos
nós, ele se apaixona e se torna vulnerável.
Sofre de saída uma derrota
monumental, no confronto com Labão, seu sogro e parente, são vinte e um anos de
trabalho semi-escravo. Na luta pela vida, Jacó é vencido pelo amor.
“Mas Jacó amava mais a Raquel do
que a Lia; e continuou servindo a Labão por outros sete anos” (Gn 29, 30b).
Toda a narrativa do capítulo 29
pode ser lida como um pequeno conto de amor. Um encontro no campo com a pastora
de ovelhas Raquel e um entusiasmado peregrino se sente em casa.
Raquel seria exatamente a sua
casa, a sua pátria, o lugar que deseja para recolher o seu corpo e para viver
sua vida. Na sociedade que fizera com Javé não ficara bem claro o lugar do
amor.
Javé parece ficar um tanto à
parte e um tanto vigilante, somente intervindo em circunstâncias específicas.
Aparece então a figura de Labão
que precisa ser bem definida diante da de Jacó. Labão também é ardiloso, mas
representa o poderoso e instituído, cuja astúcia significa sempre o sofrimento
do mais fraco.
No jogo contínuo das artimanhas,
Javé vai jogar do lado de Jacó, não do lado de Labão, mas não é um interventor
imediato, tem também as suas astúcias e isso significa administrar o tempo de
modo a alcançar também seus próprios objetivos.
Jacó, apaixonado por Raquel, se
oferece como trabalhador gratuito por sete anos e Labão aceita, dissimulando os
seus planos que são ainda mais ambiciosos. Raquel será o salário de Jacó,
prêmio maior, riqueza ambicionada acima de qualquer coisa.
Cumprido o prazo, terminada a
festa, na obscuridade da tenda, Jacó recebe Lia, a irmã mais velha como mulher
e só descobre que foi enganado no dia seguinte.
A narrativa tem as suas sutilezas
e o texto diz que Lia tem os olhos belos, mas Raquel é bela de porte e de
semblante, ou na linguagem comum de hoje, bela de rosto e de corpo.
Nas paixões que não conseguimos
controlar, os caminhos da beleza. Jacó ama os olhos de Lia e ama toda a Raquel,
rosto e corpo. Labão oferece novamente Raquel por mais sete anos de trabalho.
Jacó aceita e o texto diz que
esse tempo lhe pareciam sete dias, pelo muito que a amava. Quando termina o
prazo, Jacó recebe finalmente Raquel, mas resolve publicar a diferença nos
amores. Porque amamos também por gradações e amamos diversas pessoas de modo
diferente. E Jacó serve mais sete anos, voluntariamente, pelo amor a Raquel.
E assim termina esse momento da
narrativa. Quanto vale o amor e que amor vale tanto? Para Jacó, Raquel era
lugar, morada, pátria, salário, vida, tudo.
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