terça-feira, 1 de março de 2011

De tijolos e de horizontes

Gn 12,1-3

“Ora, disse o Senhor a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, e vai para a terra que te mostrarei; de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção: abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão benditas todas as famílias da terra.”

Entre as vozes que vinham a Abrão havia uma especial, a voz de Javé.

Javé era o Deus amigo, afeito a amizades inesperadas. Abrão aprendeu pouco a pouco a distinguir, entre todas as vozes, a voz de Javé.

Javé escolheu Abrão, em sua mania de escolher, em seu jeito de predileções, quando de vez em quando colocava o olho em alguém. Gostava de olhar o povo, mas sempre escolhia alguém.

Toda a questão de Javé era realizar o projeto de um mundo melhor do que esse. Um mundo parecido com o jardim, onde passeava com o homem. Javé tinha saudades do jardim e fazer do mundo um jardim era sua quase obsessão.

Mas o povo parecia gostar de tijolo, pedra, barulho e mau cheiro, e vivia se aglomerando em cidades cada vez maiores. Isso causava muita pressão e brigas e mortes, mas o povo parece que se acostumou e até gostava da violência.

Por isso, era preciso sempre escolher e desinstalar alguém. Abrão era o amigo da vez, companheiro de projeto.

A ordem era sair e ir para. Sair do certo, conhecido, costumeiro e ir para o incerto, desconhecido, inusitado. De um presente garantido para um futuro sem nenhuma garantia, senão as promessas de Javé. E as promessas de Javé seguem uma lógica diferente.

Prometia fazer de Abrão o pai de uma grande nação. Mas Abrão sabe que uma pessoa só não constrói um mundo e paternidade era alguma coisa que ainda não conhecia. E Abrão não era nenhum garotinho.

Muita gente estava procurando as cidades, mas a palavra de Javé propunha a migração inversa: da cidade para o campo, do tijolo para o horizonte.

E Abrão, com os olhos cheios de horizontes, sai com um intuito, uma promessa e um desafio dado por Javé: abençoar.

Javé acredita na força de uma única pessoa. Uma única pessoa pode mudar o mundo e todas as famílias da terra podem ser diferentes, se uma única família acontecer.

Javé acredita especialmente na força e na direção do olhar. Quem olha para o horizonte muda o mundo. O jardim sem violência é alcançado por um novo modo de olhar.

Migrando da cidade para o campo, os dias de Abrão encheram-se de sol, as noites encheram-se de estrelas e os seus sonhos encheram-se de horizontes.

Por tudo isso, é preciso aprender a discernir vozes e acolher a voz que desinstala, que quebra rotinas e enche os nossos sonhos de horizontes.

Um comentário:

  1. Eita, Marcos... Essa voz que desistala e propõe abandono a tijolos incomoda tanto. Obrigado por mais essa inquietação. Saudades de vc.

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