sábado, 7 de agosto de 2010

Um grande jogo


Na pequena, porém decente cidade do interior, onde o jogo de bola era levado a sério e muito a sério mesmo, era chegado o momento da esperada final. Os dois times, o Palingada Futebol Clube e o Clube de Regatas Magindolo, haviam dividido a cidade e empolgado suas respectivas, fiéis e vibrantes torcidas. Se o futebol nem sempre era habilidoso, os dois times revelavam uma garra incomum, fazendo de qualquer previsão coisa mesmo de torcedor que arriscava palpites bem comedidos. Um a zero, dois a um ou decisão nos pênaltis, depois de empates no tempo normal e na prorrogação.

O juiz sorteado foi Romildo, que apitava assim à européia, deixando o jogo correr solto para não perturbar o espetáculo com excessivas paradas. O apito não era parte obrigatória do jogo e se esse fosse bom, o apito seria quase acessório e esse jogo era bom, era muito bom.

A disputa corria acirrada, como os torcedores esperavam, e a expectativa crescia, à medida que o tempo passava sem ninguém conseguir fazer gol. Aliás, ninguém ainda havia conseguido ameaçar o gol de nenhum dos dois lados, louvores para essas defesas aguerridas que, em final de campeonato, parecem dispostas a tudo. O juiz cumpria o que prometia, permitindo o corpo a corpo e fazendo a disputa ainda mais árdua.

Deixou correr mesmo quando o defensor, Zé Beto, deu uma duvidosa tesoura por trás que, mesmo tendo derrubado o adversário, Romildo interpretou como jogo legítimo, inteligente uso do corpo. Elielton escapou pela direita, ou quase escapou, impedido de prosseguir por um safanão de Chico Caboclo que o jogou nos braços da torcida, para delírio das arquibancadas repletas. O juiz, impávido, interpretou como lance normal (e eu tenho de concordar que é normal que um camarada se desequilibre com um trompaço daqueles).

O lance mais comentado depois, houve reação barulhenta da torcida, foi aquele em que subiram os dois, Aduvaldo, atacante do Palingada de quase dois metros de altura e largura (um monstro desses devia ser proibido de pular) e o goleiro, chamado Coruja, também alto, mas não tanto. A cotovelada do Coruja abriu o supercílio direito do Aduvaldo, mas o juiz explicou depois que aquele somente abrira os braços para se defender. A torcida do Magindolo, maldosamente, em chacota, afirmava que qualquer pancada em Aduvaldo sempre seria interpretada como legítima defesa por aquele juiz que devia ser funcionário do clube.

Apito para terminar o primeiro tempo, intervalo, apito para começar o segundo e o jogo seguia bem, com as duas torcidas felizes, talvez graças a esse juiz à européia, que julgava com bastante precisão, mas com muitos atenuantes, o que também é de lei. Futebol é jogo que permite o contato corporal e nem todo pontapé, pisão, cotovelada, tesoura, carrinho pela frente ou por trás, empurrão, safanão, soco ou cascudo, precisa ser necessariamente faltoso.

Quarenta e três minutos do segundo tempo, zero a zero, e Romildo ainda não havia usado o apito depois do reinício da partida. Não tinha sentido necessidade, o futebol estava sendo duro, duramente disputado, mas em nenhum momento houve violência. Pouquíssimos lances duvidosos que preferiu deixar correr. Assim, à européia. Mesmo assim, Romildo estranhou o fato. Nenhuma falta, tudo bem. Mas nenhum lateral, nenhum escanteio, nenhum tiro de meta, nenhum impedimento havia acontecido.

Então, deu um apito prolongado de um modo diferente. Parou o jogo, reuniu todos os perplexos jogadores no meio do campo e falou assim, meio distraidamente:

– Eu bem que estava sentindo falta de alguma coisa – E calmamente foi buscar a bola.

Um comentário:

  1. KKKKKKKKKKKKKK... Ta parecendo com as partidas do Seminário... principalmente qd Genão e jefinho estão em lados opostos... rssssss

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