sexta-feira, 6 de agosto de 2010

PASSAGEIROS DO TITANIC


Marcos Monteiro*

No filme sobre o Titanic, no momento do naufrágio inesperado, enquanto se luta pelos botes salva-vidas (mulheres e crianças primeiro, claro), um homem persegue loucamente a tiros o rival, alguém trancou as grades de acesso da segunda classe, condenando todos à morte e os músicos da orquestra resolvem continuar tocando até o trágico final. Ou seja, diversas opções existenciais, diante da catástrofe inevitável.

O nosso destino é trágico, lembra-nos Edgar Morin, e se somos definidos como “ser-para-a-morte” por Heidegger e existencialistas, dar densidade aos momentos da existência é a questão cotidiana, problema de todas e de todos que navegamos juntos em um oceano de icebergs e outros perigos invisíveis.

A ameaça sobre nosso destino individual e coletivo vem sendo anunciada pelos profetas da ciência há mais de duas décadas, acreditando alguns deles atualmente que a situação é irreversível. Para James Lovelock, por exemplo, já teríamos nos chocado com o iceberg, sendo o naufrágio apenas questão de tempo. Desse modo, a questão ambientalista deixa de ser fragmentada, as diversas soluções para os diversos problemas, para se tornar integral, questão da totalidade de nossa casa, da estrutura do planeta.

Aliás, dentro desse raciocínio, desaparece a questão ambiental e o silêncio internacional sobre o tema exterioriza a incapacidade de se tomar qualquer medida para salvar o navio. Se as medidas cabíveis não foram até hoje tomadas, inútil tentar mudar os rumos e vamos cuidar do nosso cotidiano como se nada tivesse acontecido.

Por outro lado, se ainda houver qualquer chance de sobrevivência, por pequena que seja, essa seria a própria questão. Infelizmente, no guia eleitoral que se avizinha, os candidatos a pilotarem a embarcação, tratarão a questão do nosso planeta apenas como uma espécie de música de fundo ou como matiz para as cores fortes que usarão para projetar o nosso futuro.

Então, talvez, só nos sobre escolher o que fazer, enquanto o navio afunda. Lutar pelos botes salva-vidas, classificar cidadãos como de segunda categoria, perseguir pessoas que sabem amar melhor do que nós, ou a solução estética: vamos nos embebedar de música até o momento final.

O filme apresenta ainda uma opção existencial última. Sem lugar no bote que salva a amada, o amante segura suas mãos, até morrer congelado boiando no mar. Então, lembramos mais uma vez de Morin, quando diz que a finalidade ética é o amor. Aprendamos, portanto, a amar e acreditemos que sempre haverá o último espaço e o último instante para o amor.

Salvador, 6 de agosto de 2010.

*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA. Também é coordenador do Portal da Vida e faz parte das diretorias do Centro de Ética Social Martin Luther King e da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site http://www.cepesc.com/.
Fone: (71) 3266-0055. Veja esse texto também nos blogs http://www.informativo-portal.blogspot.com/.

3 comentários:

  1. O maior desafio em ler seus textos, Marcos, é exercitar no amor, assim como você faz, e outra coisa: postar um comentário. Risos

    Gostei também deste!

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  2. Lembrei da crônica "O que será que será" do livro Vila Maravila.
    Aproveito suas próprias palavras Marcos...nos resta introduzir a prostítuuta e comerciazilizada palavra amor na nossa construção de significados e tortuosos caminhos da vida.
    Muito bom dialogar contigo!
    Bjs

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  3. Pessoal, estamos juntos nessa tentativa de aprender a amar, quando aprenderem me avisem e me ensinem logo...

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