sábado, 28 de agosto de 2010

Para bem escrever um texto


É preciso olhar fixamente para um ponto; talvez de algum ponto algum texto nos olhe fixamente. Ou passear disfarçadamente os olhos, arrodeando a vida que, disfarçado, o texto deseje mesmo é o súbito brilho do nosso olhar.

Ou então, amortecer o olhar; todo texto tem sonoridades e precisa de uma escuta atenta para entrar pelo ouvido e invadir o corpo, enquanto ritmo requebrante. As batidas do texto devem comandar as batidas do coração para que os dedos tamborilem sobre a mesa e se façam escrita.

Fechar os ouvidos e abrir as narinas para respirar os textos. Eles vem como vento sobre todos os poros e tem sofreguidões diferentes. São brisa e são fúria; consolam ou devastam a nossa solidão escrevente. E tem perfumes desiguais, até mau cheiro a nos causar náuseas, mas costumeiramente perfumes de flores.

Prender a respiração e mastigar o texto devagarzinho. Os saberes são sabores e os textos tem texturas que precisam ser apreciadas em sua diversidade. Os temperos precisam ser deslindados pela ponta da língua até que o cominho e a pimenta se tornem proporção escrita.

Iniciar um jejum para oferecer-se como pele aos desejos do texto. Textos vem como carícia na nuca ou como dedada na bunda, desconcertante. Porque textos às vezes estupram e precisamos decidir, diante de suas insinuações atrevidas, se lhes cortamos as intenções, se vamos negaceando ou se nos abandonamos à perigosa volúpia.

Melhor, talvez, acender todos os sentidos e deixar o texto vir como beijo na boca. Essa linguagem típica da língua de mulher bonita, beijo sonoro, beijo cheiroso, beijo gostoso, beijo que toca nosso corpo maciço e nossas interioridades adimensionais.

Melhor ainda: desligar os sentidos e o pensamento e simplesmente escrever o texto.

2 comentários:

  1. Não tem nada mais arretado do que saber, digo, saborear ideias comunais, ideias que se hemapoetizam e viram palavras, que separadas nos unem fazendo acontecer em memórias, cenas indescritíveis, inenarráveis, onde o passado nos presenteia com o que vai acontecer. Assim são os textos desse cara que se ama de graça; o dameiro de Casa Amarela, o esquesito do Pinheiro, o caminhante do Sobradinho, o peregrino que assusta Zaratustra, e alegra os hereges, assim como eu.

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  2. Eita Marcos, seus textos têm vida. Tornaram-se escritores, autores nossos. E eu, texto escrito por textos seus, vou permanecendo aqui, a exemplo de outros seus textos, escrevendo e sendo escrito. Aguardando outros textos que escrevam meus próximos escritos passos. Um abraço, meu amigo.

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